Estou para escrever este post faz algum tempo. Ao contrário de outros artigos, este é um que eu deveria ter escrito com o calor da emoção, mas por diversas coisas deixei passar. Tudo bem… Vamos aos fatos.
Este é um dos cruzamentos que passo todos os dias pela manhã ao levar minha pequena para a escola. O famoso cruzamento das avenidas Faria Lima com Juscelino Kubitschek. É neste farol que ficamos parados por alguns poucos minutos, mas tempo suficiente para que a rotina nos faça conhecer e quase conviver com os ambulantes que circulam entre os carros.
Tem gente que distribui os jornais da manhã gratuitamente. Outros vendem capinhas e carregadores de celular. Mas havia um vendedor em especial, um corcundinha, que vendia panos e flanelas, que sempre tinha um sorriso no rosto e que sempre acenava com a mão para mim e para a minha filha, que envergonhada dava risada e se escondia na cadeirinha.
E assim era todos os dias. Eu parava no farol, ele passava pelo meu carro, nós dávamos bom dia a ele (com a janela fechada), e ele respondia com aquele sorriso fácil, dentes brancos, acenando e olhando para a minha pequena.
Chegou o final do ano de 2012 e seria uma das últimas vezes que passaria por lá. Desta vez abri a janela do carro e desejamos feliz ano novo pra ele. Seu nome era Adriano e nos contou que também estava saindo de férias. Contou também que por ter problemas de saúde ele viajava sem precisar pagar passagem. Iria para o nordeste rever a familia.
O final do ano passou, o novo ano começou, e a rotina idem. Como sempre passávamos pelo cruzamento e o ritual diário do bom dia ao Adriano voltou. Minha pequena sempre rindo e se escondendo dele e ele sorrindo e acenando para nós.
Passado alguns meses, notamos que ele sumiu. Até a minha pequena percebeu que aquele vendedor não estava mais lá. Inventei uma desculpa e ela nunca mais percebeu…
Certo dia, parado naquele cruzamento durante um trânsito infernal de São Paulo, resolvi perguntar a um outro vendedor tradicional do cruzamento, por onde andava o “corcundinha vendedor de panos”. Ele me respondeu:
– Você está querendo saber do Adriano?
– Sim, respondi a ele.
– “Vixi”…. esse era o cara mais safado, cabra da peste que tinha por aqui. Morreu de tanto beber e se drogar.
Neste momento bateu um mix de desconfiança, susto, surpresa, etc. Mas ele continuou…
– Aquele safado gastava todo dinheiro que ganhava com bebida, droga, prostituta. Parava de vender para dar uma “cheirada” lá no canteiro central.
Nessas horas você nem sabe o que fazer, o que falar. Apenas ouve. E ele continuou…
– E tem mais se você quer saber. Aquele safado “estrupava” (sic) a própria sobrinha. Morreu o desgraçado.
Farol verde.
Fui embora pro meu destino com uma sensação tão ruim que até hoje penso na história. Fico pensando nas pessoas que vemos diariamente e que ao mesmo não sabemos absolutamente nada sobre elas. Construimos uma imagem e na realidade é tudo ao contrário. Uma sensação de que infelizmente não é possível confiar em quase ninguém.
Se ele morreu mesmo, só Deus sabe. Mas até hoje ele nunca mais apareceu naquele cruzamento.
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