Doação compartilhada beneficia pacientes com dificuldade de custear os tratamentos; outros pontos ainda podem melhorar.
Em vigor há cerca de um mês, nova resolução publicada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) traz uma série de mudanças nas normas éticas para a utilização de técnicas de reprodução assistida. A medida entende a importância da infertilidade humana como um problema de saúde, destacando implicações médicas e psicológicas, bem como a legitimidade do anseio de superá-la. No texto, destaca os avanços do conhecimento científico que permitem, atualmente, solucionar uma série de problemas de reprodução humana.
A nova resolução, elaborada por uma Comissão especialmente formada para revisão da resolução anterior (nº 1.358/92), parte da necessidade de harmonizar o uso destas técnicas com os princípios da ética médica, facilitando o processo de procriação e beneficiando o maior número possível de pacientes. De acordo com o dr. Newton Busso, presidente da Comissão Nacional Especializada de Reprodução Humana da Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e da Sociedade Paulista de Medicina Reprodutiva (SPMR), as novas regras realmente ampliam o acesso, especialmente ao permitir a doação compartilhada.
“Temos hoje mulheres jovens, que mesmo como ovários funcionando muito bem, precisam do tratamento. Mas que não tem os recursos necessários para o custeio e, segundo as regras até então vigentes, não poderiam receber qualquer beneficio. Ou seja, embora permitido por lei, havia este cerceamento ético. Hoje, a resolução CFM nº 2.013/13 prevê que esta mulher tenha, em seu tratamento, a participação de outra mulher que precise de tratamento, mas também de óvulos”, explica.
Doação compartilhada: uma ótima notícia
A doação compartilhada significa que duas mulheres distintas, necessitando de tratamento de reprodução assistida, poderão participar, como doadora e receptora, compartilhando tanto do material biológico quanto dos custos financeiros que envolvem os procedimentos. “Esta mudança certamente amplia o leque e oferece acesso a muitas mulheres que tinham como único obstáculo a questão financeira. Ainda assim, é apenas uma alternativa a um problema muito maior, que é a falta de cobertura por parte da saúde privada destes e de muitos outros procedimentos relacionados à reprodução assistida”, alerta dr. Newton.
Em outras palavras, embora a infertilidade seja doença reconhecida pela OMS, a cobertura à reprodução assistida, que inclui técnicas como a inseminação artificial e a fertilização in vitro, não é incluída no rol de procedimentos da ANS, o que permite aos planos e seguros-saúde não cobrirem estes tratamentos.
Por meio de Resolução Normativa (RN nº 211, de 11 de Janeiro de 2010), a ANS exclui do rol obrigatório as técnicas inseminação artificial. A resolução contraria, inclusive, uma sanção presidencial assinada em 2009 pelo então presidente Lula, que determina a cobertura do atendimento nos casos de planejamento familiar pelas operadoras.
Outros pontos
A nova resolução limita claramente o número máximo de oócitos e embriões a serem transferidos para a receptora, que não pode ser superior a quatro. O número a ser transferido depende da idade da doadora, e parte de 2 embriões de mulheres com até 35 anos; 3 embriões entre 36 e 39 anos; e até 4 embriões para mulheres com até 50 anos de idade. Esta é também a idade limite para se submeter às técnicas de RA, bem como doar temporariamente o útero (barriga de aluguel). Para a doação temporária do útero, ainda, houve a inclusão da possibilidade de ocorrer em parentesco consanguíneo até o quarto grau. Ou seja, o que antes só poderia ocorrer com mãe, irmãs ou avós, agora está também permitido a tias e primas.
Pontos em discussão
Um ponto que merece atenção é o do descarte de embriões criopreservados. Em caso de não utilização, após mais de cinco anos, os embriões poderão ser descartados se esta for a vontade dos pacientes, segundo a nova resolução do CFM. No entanto, a permissão ética do Conselho esbarra na Lei de Biossegurança, que autoriza a doação de embriões para pesquisas de células-tronco, mas não o seu descarte. Segundo o dr. Newton, o descarte de embriões criopreservados não é permitido pela Lei de Biossegurança. “Ainda que haja, hoje, o respaldo ético desta resolução, o ideal é que este debate seja amplamente divulgado, de modo a incentivar as autoridades a resolver este impasse o mais breve possível.”
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